Sem Treta

Póvoa de Lanhoso, a terra do ouro

A filigrana é muito utilizada na região Minho. Uma tradição longínqua que pode ser apreciada principalmente nos vestidos de noiva tradicionais e em trajes femininos de ranchos folclóricos. A Póvoa de Lanhoso, considerada a terra do ouro, é o expoente máximo na arte de trabalhá-la, evidenciando costumes e características únicas. Um valioso património, onde vários artesãos existentes trabalham afincada e delicadamente, com enorme habilidade na arte da filigrana, em oficinas próprias, produzindo inúmeros artigos valiosos. Nesta localidade, ainda é preservada esta tradição artesanal, cotando-se como um exemplo de grande promoção local e uma actividade de grande relevância na economia da região. Museu do Ouro valoriza trabalho artesanal O Museu do Ouro de Travassos, inaugurado em 2001, é um grande exemplo na preservação desta atividade e surge como resultado de um processo de valorização e de dignificação do trabalho artesanal do ouro. A abertura ao público do Museu do Ouro, em Travassos, prendeu-se com o facto de esta freguesia ter ainda um número significativo de oficinas artesanais em funcionamento e vestígios arquitectónicos de muitas outras. Ao longo do tempo, tem vindo a promover uma série de atividades, como exposições, edições de brochuras, visitas guiadas e trabalho com escolas do concelho da Póvoa de Lanhoso. Para além de musealizar, dinamizar as oficinas ainda em laboração e colaborar na recuperação das que se encontram em ruínas, o Museu do Ouro é uma instituição ativa, ao serviço da comunidade que lhe deu origem, e nela criando um polo dinamizador da região e do respectivo saber tradicional, dirigido a uma ampla região e a públicos diversificados. A ideia da criação de um museu da ourivesaria em Travassos data dos anos 80 e resulta dos esforços de um ourives – Francisco de Carvalho e Sousa – que ao longo de 50 anos de atividade foi recolhendo espólio e documentação, formando uma coleção importante e que é a parte principal do núcleo inicial do Museu. O edifício do Museu engloba duas oficinas de épocas diferentes já desativadas, fazendo parte da Casa de Alfena. Nestas duas oficinas foram criados quatro espaços expositivos, uma reconstituição de uma oficina dos anos 50, uma sala do ouro, uma sala de exposições temporárias e uma loja de ouro tradicional português.

 

 

Oficina do Ouro: mãos de ouro na arte de trabalhar a filigrana

Fomos, igualmente, até Sobradelo da Goma, também na Póvoa de Lanhoso, para conhecer a Oficina do Ouro que tem passado de geração em geração. Os tempos são outros, a valorização do ouro mudou. Mas aqui, nesta que é a segunda casa de Elsa Rodrigues, o amor pela filigrana é o mesmo de há 33 anos atrás. Foi com o seu pai que aprendeu esta arte e, mais tarde, juntamente com o seu marido e o seu cunhado, foram amadurecendo esta oficina. Mas o que é a filigrana? Esta arte trabalha os fios de ouro. Manualmente. Pormenor a pormenor. Uma técnica que surgiu entre 2000 e 2500 a.C., que se foi perdendo em vários países, mas que, em contrapartida, prevaleceu em Portugal. A partir do século XVII, a filigrana portuguesa já tinha construído um caminho muito próprio e assentava em moldes muito diferentes de qualquer outra. Hoje em dia, as peças feitas em filigrana podem-se encontrar principalmente na zona norte do país, sendo que a Póvoa de Lanhoso é a chamada Terra do Ouro! Razão mais que suficiente para irmos até lá, de forma a percebermos que arte é esta e conhecermos o processo de construção de uma peça. Primeiramente, como nos conta Elsa, é preciso fazer a fundição do ouro. Colocá-lo dentro do cadinho, como lhe chamam, e derreter. Aqui, o processo é diferente para peças de ouro (mistura de prata e cobre) e peças de cobre (apenas cobre). O cadinho é depois retirado e o metal vertido numa rilheira de ferro que lhe dá a forma de uma barra comprida.

De seguida é feito o lingote, ou seja, é puxado o fio de ouro num cilindro, que acaba por se transformar num fio de centenas de metros. Depois de estar nas dimensões pretendidas, é estirado nos “rubis”, peças de ferramentas que possuem uma largura superior à fieira e que permitem a obtenção de fio com espessuras inferiores a 0,2mm. Pegam-se em dois fios e torcem-se à mão e, juntos, são depois esmagados por um cilindro. Tornam- -se assim mais leves e laminados e constituem o torcido que é tão importante para a obtenção do resultado final rendilhado da filigrana. O passo seguinte será fazer a estrutura da peça, minuciosamente, e enchê-la. É neste processo de enchimento que se vê o trabalho artístico que se faz nesta arte, a agilidade e a paciência que se tem de ter neste momento… é aqui que percebemos que realmente estas peças são feitas com amor, com gosto. Terminando a construção da peça, esta é colocada em água para humedecer e, depois disso, é coberta com pó de ouro e soldada para que todos os componentes fiquem fixos uns aos outros. O acabamento de uma peça de filigrana passa pela lavagem, pois depois de todo este processo a cor fica suja e oxidada. Este é um banho químico, a que Elsa lhe chamou «de corar», onde se utiliza uma escova fina de metal para esfregar a peça com água e detergente até esta ficar brilhante. Da cor amarelada do ouro. Porque é que a filigrana é uma técnica tão preciosa? Porque as peças feitas de fios com espessura igual ou inferior a 0,22mm só podem ser feitas manualmente. Isso sim, é uma mais-valia. É uma garantia de que possuímos uma peça totalmente feita à mão. Aqui se vê o porquê de ser uma arte tão especial, tão bonita. E é precisamente por esta razão que esta família mantém este legado. E não o deixa desaparecer.

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