Carolina Galeão Figueiras
Marketeer e voz do podcast Ideias a Mais (www.ideiasamais.pt)
Estamos rodeados de tecnologia que nos impressiona. Plataformas que aprendem connosco, algoritmos que nos antecipam os passos, inteligência artificial que nos responde com uma confiança que pode até ser intimidatória… no meio de tanto deslumbre, do tanto que se fala e do pouco que se faz, há uma pergunta que me acompanha cada vez mais: será que estamos mesmo a evoluir?
Não me refiro à inovação em si, mas de nós, as pessoas por trás dos processos, das decisões, das perguntas que (ainda) não foram feitas.
Contratamos fervorosamente quem domina ferramentas, mas demoramos a perceber quem sabe mesmo pensar e faltam-nos os estudos para compreender como podemos compreendê-lo. A técnica tornou-se condição mínima, porque o que realmente escasseia é algo mais: pensamento crítico, empatia, discernimento. A capacidade de parar para perguntar “porquê?”, quando tudo à nossa volta grita “segue em frente”, “mostra que sabes”. Abrimos o ChatGPT ainda antes de pensarmos em contexto, em eventuais soluções ou alternativas. Passámos a ser imediatistas até para pensar, principalmente para pensar… Pedimos que resolva, e “ele” resolve. Ou tenta. Ou não consegue porque precisamos de pensar como podemos pedir-lhe que ele resolva, “não era bem isto”. O que a IA não sabe (ainda – e essa é a parte que assusta) é aquele um histórico de tensão, nuances políticas, sensibilidades, que o cliente está a atravessar uma fase delicada, perceber o timing, que hoje há jogo, que se queimou o arroz ou é o aniversário do miúdo. Responder é fácil. Ler o invisível é que exige talento.
Há coisas que me assustam mais do que o avanço da tecnologia, ainda que esta tenha tanto de útil como de temível. Não me assusta ter ajuda para realizar tarefas e utilizar ferramentas para desbloquear processos ou dar um empurrão às ideias, pelo menos para já. Preocupa-me que nos esqueçamos de cultivar o que ela não consegue replicar: a escuta ativa, a leitura do contexto, a coragem de não ter uma resposta imediata. Tudo o que diferencia o artificial do humano. Um pouco falho, um pouco reticente, honesto, sábio…
Os desafios de hoje não pedem apenas mais competência técnica. Pedem pessoas inteiras, com pensa- mento próprio, capazes de resolver problemas com mais do que lógica – com presença, com consciência, com humanidade. No auge da lamechice, diria, com coração.
E isso, por enquanto, não se programa. Cultivemos.