Nascida em 1948, em Stanislav, então parte da União Soviética e hoje território ucraniano, Svetlana Alexievich cresceu na Bielorrússia, país que viria a marcar profundamente a sua identidade e a sua obra. Filha de pai bielorrusso e mãe ucraniana, desde cedo revelou sensibilidade para as palavras e uma inquietação perante o silêncio imposto pelos regimes autoritários. Formou-se em jornalismo na Universidade de Minsk nos anos 70, mas depressa percebeu que não queria apenas relatar factos, queria escutar pessoas, mergulhar nos recantos mais íntimos da experiência humana e dar voz àquilo que os livros de História não registam. A sua obra distingue-se por um estilo único, híbrido entre o jornalismo e a literatura, que ela própria apelida de “romance de vozes”. Svetlana Alexievich não escreve ficção, constrói as suas narrativas a partir de centenas de entrevistas que realiza ao longo de anos a homens e mulheres anónimos que viveram guerras, colapsos, tragédias nucleares e transformações sociais profundas.
Das suas palavras, nasce uma polifonia emocional, onde cada testemunho é uma peça de um mosaico maior. Entre os seus livros mais impactantes, destaca-se Vozes de Chernobyl (1997), A Guerra não tem Rosto de Mulher (1985) ou O Fim do Homem Soviético (2013), talvez o seu trabalho mais ambicioso, que retrata o colapso da URSS e o vazio ideológico que se seguiu. Com grande sensibilidade, revela o trauma coletivo de um povo que, de um dia para o outro, viu ruir o mundo onde nasceu e cresceu. Apesar do reconhecimento mundial, a sua obra nem sempre foi bem-recebida no seu país natal. A frontalidade com que expõe as feridas do regime soviético valeu-lhe perseguições, censura e o exílio.
Mas nem isso a demoveu. Em 2015, o seu contributo singular para a literatura e a memória histórica foi consagrado com o Prémio Nobel da Literatura, uma distinção rara para alguém que escreve não romances, mas realidades. Svetlana Alexievich não escreve para entreter, escreve para lembrar. A sua literatura é um ato de resistência, um tributo à dignidade humana. Em tempos de ruído e desinformação, a sua escuta paciente transforma a dor dos outros numa forma de conhecimento profundo. Porque, como ela própria diz, “nada é mais espantoso do que a vida real”.
Aconselhamos A LEITURA 400 páginas
“A GUERRA NÃO TEM ROSTO DE MULHER” Alexievich dá palco às memórias silenciadas das mulheres soviéticas que combateram na Segunda Guerra Mundial, vozes que, até então, tinham sido omitidas do grande relato patriótico.