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JOSÉ TAVARES | CEO DA IW ENTERPRISE PORTUGAL «Sempre pensei fora da caixa. Copiar é mais fácil, mas nunca fez parte da minha metodologia»

Fundada em 2012, a IW Enterprise Portugal tornou-se, em pouco mais de uma década, uma referência nacional e internacional em design e construção de interiores, com especial destaque no setor dos cruzeiros. À frente da empresa desde 2015, José Tavares destaca o valor da diferenciação, a coragem para inovar, a capacidade de adaptação em momentos críticos e a ambição de preparar equipas sólidas para competir num mercado global em constante transformação.

 

A IW nasceu em 2012 com apenas duas pessoas em Barroselas, Viana do Castelo. Olhando para trás, qual foi o momento decisivo que transformou esse pequeno escritório numa referência nacional e internacional? 

O momento decisivo aconteceu três anos após a fundação, quando passei a liderar sozinho a empresa. Essa mudança deu-me liberdade para definir uma identidade clara, tomar decisões com maior agilidade e projetar a IW para novos desafios.

Desde o início defenderam um caminho próprio, sem “copiar ninguém”. O que significa, na prática, essa diferenciação? 

Sempre pensei um pouco fora da caixa, nunca tive simpatia em fazer o que consideramos muito comum em Portugal. Por norma, inicia-se um negócio que funciona e a seguir aparece uma quantidade de cópias, é sempre mais fácil copiar e isto não faz parte da minha metodologia. Vejam, por exemplo, as lojas de ouro usado…

«Na IW, os bons e os maus momentos vivem-se em conjunto»

A IW apresenta-se como um verdadeiro “canivete suíço” empresarial, onde cada colaborador acrescenta valor. Como se cultiva essa multidisciplinaridade na prática do dia a dia? 

Na IW os bons e os maus momentos são vividos em conjunto, tenho como costume comunicar diretamente à minha equipa as boas e as más notícias. Por exemplo, no mês de julho marquei um almoço com todos os colaboradores para discutir o futuro e a disponibilidade da equipa em continuar com a trajetória da empresa. 

Uma das mensagens fortes da IW é ter uma equipa “motivada, feliz e realizada”. Como se transforma esse propósito em políticas concretas de recursos humanos? 

Para além da boa relação com todas as pessoas da empresa, temos tempo para tudo. Temos um cuidado muito grande com os colaboradores, desde a sexta-feira com tarde livre, os seguros que oferecemos (seguro de saúde e de acidentes pessoais), e a atenção à vida privada de cada colaborador fora da empresa. 

Que impacto teve a pandemia na forma de gerir a empresa e de motivar as equipas? 

A pandemia teve um impacto profundo. Durante 18 meses, fomos forçados a mudar o core da empresa, já que o nosso mercado principal (restauração, hotelaria e comércio) estava fechado. Vimos uma oportunidade na remodelação de habitação e redirecionamos o foco sem recorrer a despedimentos ou lay-off. Apesar das perdas financeiras, mantivemos todos os salários em dia. Isso fortaleceu a nossa resiliência e capacidade de adaptação. A equipa manteve-se motivada, embora muitos não tenham percebido a gravidade do momento – algo que, na altura, optei por não partilhar. Vivi esse período em solidão enquanto gestor, o que gerou alguma tensão ocasional, mas no geral, a equipa correspondeu muito bem. 

Dos quiosques aos navios de cruzeiro, passando pelos projetos habitacionais e espaços comerciais, a diversidade da IW é impressionante. Há algum setor onde se sente que a empresa é mais disruptiva? 

Sim. Atualmente, o setor habitacional tem menos prioridade, sobretudo pela falta de mão de obra. Restauração, hotelaria e comércio seguem com forte procura, mas essa escassez afeta tanto a IW como os nossos parceiros. Onde realmente nos destacamos é nos cruzeiros, com 8 anos de crescimento contínuo e reconhecimento do nosso trabalho. Com mais mão de obra, poderíamos expandir significativamente em áreas como decoração comercial, restauração e fornecimento de inox para hotelaria, mas esse é um desafio comum a muitas empresas. 

O design de interiores em navios de cruzeiro tornou-se uma das bandeiras da IW. Que desafios únicos este setor apresenta, face a projetos em terra firme? 

Trabalhar em cruzeiros traz desafios adicionais, onde a inovação é essencial e faz realmente a diferença. Num projeto recente, num cruzeiro de renome mundial (cujo nome não posso revelar por questões contratuais), fomos desafiados a revestir pilares ovais com chapa em alumínio com detalhes decorativos em baixo-relevo. A solução técnica que desenvolvemos continua a ser um segredo interno da IW, mas envolveu a aquisição de novas máquinas e ferramentas de carpintaria e serralharia. A combinação certa desses recursos foi fundamental para o sucesso. Aliás, é notável como a equipa da IW adota uma postura diferente quando trabalha em cruzeiros – o foco e a entrega aumentam consideravelmente. 

O mercado habitacional foi um passo mais recente. O que levou a IW a diversificar e entrar neste segmento? 

O setor habitacional foi um pouco consequência do encerramento do nosso mercado, sendo um refúgio às consequências da pandemia. Neste momento, só o fazemos em situações especiais, pois a falta de mão de obra é uma problemática acrescida. O core da IW Enterprise continua a ser: comércio, restauração (muito por termos capacidade para produção de equipamento hoteleiro), a hotelaria e como é óbvio, os cruzeiros. 

Que tipo de liderança procura exercer na IW: inspiradora, estratégica, pragmática? 

Pragmática. Só estarei totalmente satisfeito quando eu não fizer falta. Quando a equipa for capaz de seguir em frente sozinha, e, neste momento, falta muito pouco, sinto que estou no bom caminho. 

«Sem uma equipa motivada não há resultados financeiros, nem reconhecimento do mercado»

O que mais o orgulha enquanto CEO: os resultados financeiros, o reconhecimento do mercado, ou o impacto que tem na vida da equipa? 

São coisas indissociáveis, pois não é possível atingir um conceito sem os outros. Sem uma equipa motivada não é possível ter resultados financeiros, nem reconhecimento do mercado. E sem resultados financeiros também não é possível que uma empresa consiga fazer grandes gestos para manter a equipa satisfeita. Chamo a isto “Pescadinha de rabo na boca”. 

A IW fala muito em sustentabilidade. Quais são as medidas mais concretas que já estão a implementar neste campo? 

Para além daquilo que é mais fácil, a colocação dos painéis solares, a reciclagem de lixos e sucatas, tentamos sempre que nos é possível adquirir materiais regulamentares, tintas à base de água, entre outros. 

Enquanto PME líder e PME excelência, como encara a responsabilidade social da empresa no contexto local e nacional? 

Nada tem a ver com o facto de ser PME Líder ou PME Excelência, mas a responsabilidade social para mim tem um conceito um pouco diferente da maioria das pessoas. Por norma, não ajudo financeiramente (quer sejam instituições ou pessoas), prefiro adquirir bens e doar ou ajudar, por exemplo, uma escola (onde temos oferecido algum mobiliário). Por norma, tudo isto é no anonimato, toda a ajuda que dou realiza-me enquanto indivíduo. 

França tornou-se um mercado estratégico, com previsão de faturar 2,3 milhões de euros ainda este ano. O que torna o mercado francês tão promissor? 

Para a IW o mercado francês é o mercado dos navios cruzeiro, e este é um mercado em grande expansão. Neste momento, uma fatia grande da nossa faturação deve-se a ter contratos assinados até 2029. Posso dizer que o estaleiro tem trabalho garantido por 11/12 anos e nós por 5 anos, sabendo que, entretanto, entramos em futuros concursos para contratos de 2030 a 2035. 

«A exigência é máxima e não pode haver margem de erro»

Quais são os maiores desafios de competir internacionalmente com gigantes do setor? 

O desafio é basicamente a capacidade de inovação todos os dias, não esquecendo que a qualidade e prazos de entrega são “o fator”, não pode haver margem de erro. Quando temos, por exemplo, uma obra onde os degraus das escadas são revestidos a cristais Swarovski, sabemos de forma instintiva que o nosso trabalho não pode deixar de corresponder àquele grau de qualidade. 

Até 2030 projetam chegar aos 3,3 milhões de faturação só em França. Podemos esperar novos mercados além do francês? 

Neste momento, não estamos a prever novos mercados, muito pela falta de mão de obra. Neste momento o nosso objetivo é estabilizar a equipa, aos poucos até crescer a equipa, se possível, apenas após isso, pensamos em novos mercados. Temos já trabalhos feitos em Angola e Espanha, mas projetos pontuais, neste momento, não pretendo dispersar forças, mas manter-me constante nos mercados já implementados. Estamos a investir consideravelmente em máquinas nos setores da carpintaria e da serralharia. Estes investimentos são a única forma de ir combatendo a falta de mão de obra que estamos a sentir. 

A IW tem no ADN a combinação de arte, técnica e inovação. Como é que estas três dimensões se cruzam num projeto concreto? 

Na construção do pilar oval, foi necessário muito estudo e muita experiência sobre a forma como seria possível tecnicamente realizar a ideia dos designers. Houve muito “estrago” de material com estes estudos e testes, mas era necessário para conseguirmos obter o resultado pretendido. 

«O futuro da empresa passa por preparar pessoas capazes de seguir em frente sem mim»

Abordando a próxima década, como imagina a IW em 2035? 

Como referi anteriormente, tenho de preparar as pessoas para o futuro ou contratar (prefiro preparar as pessoas que tenho já integradas na equipa). Tenho 60 anos, os meus filhos têm as suas empresas e não querem continuar com o meu projeto. Assim, o futuro da IW passa por formar pessoas que sejam capazes de seguir em frente e dar-me um pouco de descanso. Mas prevejo um futuro brilhante sem falsas modéstias… quantas empresas se podem vangloriar de ter uma carteira de clientes a longo prazo como nós temos? Neste aspeto, acho que estou a fazer um bom trabalho e penso ter pessoas, cada um na sua área, para fazer este trabalho. 

Que papel terá a tecnologia – como a automação, a inteligência artificial ou os novos materiais – no futuro da empresa? 

As máquinas que estamos a adquirir são todas máquinas 4.0, capazes de fazer o trabalho com programação antecipada a partir do escritório. Mas, na nossa área, a mão de obra especializada vai ser sempre predominante, agora podemos é fazer mais trabalho dentro das instalações em vez de o efetuarmos no local da obra. Tal como na construção civil, o trabalho no estaleiro é cada vez mais importante. 

Se tivesse de resumir a IW numa palavra, qual seria? 

Vou resumir em duas palavras: “Canivete Suíço”. 

E se tivesse de deixar uma mensagem aos colaboradores que o acompanham nesta viagem, qual seria? 

Já não seria capaz de os surpreender, pois todos os dias estou no meio da produção com todos eles. Agora, todos sabem que podem sempre contar comigo, e para mim é o mais importante.

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