“Last night I dreamt I went to Manderley again”.
E assim tem início um dos romances anglo-saxónicos mais aclamados do último século e a minha sugestão de leitura para o mês de julho. Rebecca fala-nos de um homem, duas mulheres e uma casa, sendo que a esta última compete o grande papel narrativo. O próprio livro assim o dita quando a sentencia a um penoso desaparecimento por incêndio condenando, consequentemente, a nossa narradora e o seu marido ao exílio. Este é um romance simultaneamente melancólico e expansivo. Em 1940, Hitchcock adaptou-o ao cinema e isto é a melhor descrição possível, pois nunca um romance serviu tão bem o estilo de um realizador.
Com laivos de Cinderella, a narradora de Rebecca é uma jovem sem nome, berço ou algo particularmente distintivo. Ainda assim, chama a atenção de Max de Winter, rico viúvo inglês e senhor de Manderley – uma luxuosa casa no interior bucólico de Inglaterra – que, numas férias em Monte Carlo, trava consigo conhecimento. Não obstante a diferença de idades e estatutos sociais, a narradora vê-se, abruptamente, casada com Mr. de Winter, assumindo, também ela, o lugar de senhora de Manderley. O idílico cenário esconde, porém, a nefasta presença de Rebecca, a falecida esposa de Max que, para alguns – incluindo a nossa narradora – será sempre a verdadeira Mrs. De Winter.
Segundo os mais eruditos, Rebecca foi o romance mais difícil de Daphne du Maurier. Há muito que a Autora se sentava a escrever sem conseguir produzir. Talvez por isso não tenha sido tão grande choque quando, após a sua publicação, vieram as acusações de plágio. A narrativa era muito similar à de “A Sucessora”, livro da brasileira Carolina Nabuco que, anos antes, tinha tentado vender a tradução do seu livro à editora que representava du Maurier. Não li “A Sucessora” e, por isso, não posso concluir estar – ou não – na presença de uma obra plagiada. A ser verdade é uma pena porque Rebecca é um grande romance.
Desde logo, consegue a proeza de ir manipulando o leitor que se vai envolvendo numa trama complexa e repleta de elaboradas traições. Para muitos, é sobre os ciúmes e inseguranças de uma mulher que, na verdade, falhava em se afirmar como tal. Para outros, tal como eu, é um romance atmosférico que oferece personagens negras e uma subtil e inteligente reflexão sobre género, homossexualidade e papéis sociais. Em Rebecca, os sonhos transformam-se em pesadelos, as obsessões destroem vidas e uma casa cheia de segredos parece tão real quanto os seus habitantes, mortos ou vivos.
Sinopse oficial do Livro:
Escrito em 1938, Rebecca é uma obra de fôlego, diversas vezes adaptada ao cinema. Porém, só em 1941, numa versão de Alfred Hitchcock, o filme ganharia protagonismo, chegando mesmo a vencer dois Óscares, estando nomeado para nove categorias. Rebecca é um clássico onde os sentimentos adquirem um lugar de destaque. Sentimentos no feminino, já que se trata da história de duas mulheres que se envolvem com o mesmo homem, apenas com uma particularidade: Rebecca está morta. E é o fantasma, embora nunca visível, do seu passado que assombra a nova mulher, agora casada com o nobre britânico e apaixonado de Rebecca. A intriga é assombrosa e ao mesmo tempo envolvente, deixando sempre a sensação de que Rebecca é omnipresente. E é com esta imagem antiga que a nova mulher do viúvo Maxim de Winter terá de enfrentar todos os que amavam Rebecca e que a encaram como alguém que veio para lhe roubar o lugar. Rebecca é o romance que celebrizou Daphne du Maurier e que conheceu 28 reedições em quatro anos só na Grã-Bretanha.
Daniela Guimarães
Blogger de Literatura
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