O povo, na sua sapiência, tem por costume dizer “março, marçagão, de manhã Inverno, de tarde Verão”, para justificar as manhãs chuvosas e as tardes agradáveis que se registam por estes dias.
Eu sou muito sincero, passear à chuva é coisa que não me agrada muito, embora, confesso, por vezes faça bem, dependendo do estado de espírito. Mas, na generalidade, confesso, em dias de chuva prefiro ficar ao borralho.
E se a promessa é de uma tarde com sol? Aí, já é diferente. Arranjamos uma manhã com uma atividade abrigada e, para depois de um almoço aconchegante, uma tarde onde se possa usufruir do ar puro.
Perante isto, o meu rumo neste mês de março é a cidade de Barcelos, a terra do galo e um território detentor de um imenso património ligado à história de Portugal.
E por falar no mundialmente conhecido galo de Barcelos, a manhã, previsivelmente chuvosa e de Inverno, dedico-a ao Museu da Olaria, situado na rua Cónego Joaquim Gaiolas, mesmo no centro da cidade.
Inaugurado numa sala por baixo do Paço dos Condes em 1963, em plena Festa das Cruzes, este espaço museológico teve a sua origem na coleção particular de Joaquim Sellés Paes Villas Bôas, composta por cerca de 700 peças em olaria recolhidas entre 1920 e 1952.
Já em 1982, a Câmara de Barcelos decidiu transferir o museu para a Casa dos Mendanhas, que tinha ficado devoluta, onde se encontra até aos nossos dias. Esta transferência foi o passo decisivo para a criação de um verdadeiro museu em Barcelos totalmente dedicado à olaria nacional. Foram adquiridas coleções em centros de produção de olaria extintos, ou em vias de extinção, o que fez crescer ainda mais todo o espólio.
Durante este mês de março, é possível ver a exposição temporária “Geração Mistério”, sobre uma das famílias mais importantes da olaria barcelense. Outra exposição temporária é “Barros do Telhado”, fruto de um projeto intitulado “Casa do Barro”, que nasceu do protocolo entre as Câmara de Barcelos e do Fundão. Não perca também a exposição “Olaria Norte de Portugal”, composta de peças de louça utilitária provenientes dos mais importantes centros oleiros do norte do país. Antes de sairmos do museu, tenho uma boa notícia… A entrada é gratuita, a não ser que pretenda uma visita guiada.
Depois de uma manhã bem passada no Museu da Olaria, e acreditando que o povo tem sempre razão, a tarde vai ser ao ar livre, num lugar de grande beleza. Saímos do centro de Barcelos e vamos até ao Monte da Franqueira.
Para lá chegar não são necessárias grandes indicações, uma vez que a sinalização existente é a suficiente, havendo, até, diferentes formas de lá chegar. Uma delas é, depois de atravessar a ponte antiga, seguir por Barcelinhos, em direção à Póvoa de Varzim, sem se afastar muito da cidade, tem logo após um nó rodoviário, um cruzamento onde vira à esquerda. A partir daí, não tem que enganar. É sempre em frente e a subir. E lá em cima, mais uma vez acreditando que, com o “marçagão”, a tarde é de verão, prepara-se uma panorâmica excecional. Dizem que, com o tempo limpo consegue ver-se o mar.
E, se o trouxe até aqui, acredite que não foi só para ver a paisagem. Neste local está uma das ermidas mais antigas de Portugal que, segundo reza a tradição, foi mandada erguer por Egas Moniz, o aio de D. Afonso Henriques.
Mas um dos pormenores mais interessantes do Santuário de Nossa Senhora da Franqueira está no interior do templo, que os historiadores dizem mesmo ser uma relíquia histórica. Trata-se do altar-mor em jaspe que D. Afonso, 8.º Conde Barcelos e 1.º Duque de Bragança, trouxe de Ceuta aquando da conquista daquela cidade em 1415 para oferecer à Senhora da Franqueira. Segundo os investigadores, D. Afonso, filho bastardo de D. João I, acompanhou o pai a Ceuta e tomou parte ativa na conquista daquela praça africana. Por volta de 1410, o Conde de Barcelos foi visitar Jerusalém, tendo passado por Veneza. No regresso ao reino, tomou parte na conquista da Ceuta, ao lado do pai. No final da batalha, e na hora da pilhagem, o monarca, segundo Gomes Eannes de Zurara, terá dado ao filho o Palácio do Governador Mouro de Ceuta Salá-ben-Salá, que este saqueou completamente. Assim, entre os troféus da vitória, D. Afonso trouxe consigo a mesa e as colunas em jaspe onde comia o Senhor de Ceuta e, com elas, mandou fazer o altar-mor da ermida da Senhora da Franqueira.
Voltando à estrada e estando na hora de regressar, é natural que os ares do Monte da Franqueira tenham aberto o apetite. E, daqui até Esposende é mesmo um “tirinho”, a distância ideal para aproveitar o “Março com Sabores do Mar”, antes de chegar a casa.