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«O Vodafone Paredes de Coura é amor, cumplicidade e solidariedade. É o festival com mais identidade em Portugal»

Entrevista a João Carvalho – Festival Vodafone Paredes de Coura

O Paredes de Coura é o mais antigo festival de música em Portugal a realizar-se sucessivamente e um dos mais aclamados pelo público. Sempre fiel ao espírito alternativo que o caracteriza, tem feito história na descoberta de novas promessas musicais e na apresentação dos nomes mais consagrados da música a nível mundial. Em 2023 cumpre 30 anos de existência numa edição que se realizará entre os dias 16 e 19 de Agosto. Em entrevista, João Carvalho, diretor da promotora de eventos Ritmos e responsável pela organização do Vodafone Paredes de Coura, projeta a edição de 2023, numa conversa com vários regressos ao passado.

2023 será um ano especial para o Festival Vodafone Paredes de Coura, que assinala 30 anos de existência. Que balanço é que faz desta caminhada de três décadas?
O balanço que faço é completamente positivo. Quando começámos a fazer o festival, éramos meia dúzia de miúdos que gostavam de ouvir música, que estavam a tirar um curso superior e a exercer a sua profissão. E hoje vivemos todos da música, graças a essa brincadeira, a esse momento que aconteceu em 1993.

Como é que o festival evoluiu desde o primeiro dia até aos dias de hoje?
As diferenças são enormes. Mudou tudo. O festival nasce nessa realidade. Gostávamos de passar bons momentos e de repente começamos a ganhar o gosto por aquilo. Pelo meio há uma série de problemas, que qualquer evento sente, principalmente quando se faz algo do género no interior, sobretudo na escassez de grandes patrocinadores, quando já era um evento de grande dimensão. Mas conseguimos alcançar um patamar de excelência e, permita-me a imodéstia, o Paredes de Coura é o festival que mais contribuiu para a promoção da música em Portugal. Um evento onde atuaram, entre muitos outros, Sex Pistols, The Cramps, Arcade Fire, The National, LCD Sound System, Patti Smith, New Order… foram mais de quinhentas bandas e vários nomes lendários. Por exemplo, os New Order já foram convidados para atuar em Portugal por outros promotores e recusaram porque dizem que só atuam no nosso país no Paredes de Coura. Isto é incrível… Quando uma banda histórica e que representa tanto para a indústria da música diz isto só nos resta ficar orgulhosos. Mas estas situações já aconteceram com outros nomes… revela a magia deste festival. Paredes de Coura é um festival diferente, que aposta realmente em novas bandas e as diferenças para os primeiros tempos são muito grandes. O festival começou com um orçamento de 800 euros e, hoje, custa 5 milhões. O festival evoluiu e preocupa-se todos os anos com o bem-estar das pessoas e em ter o melhor cartaz possível…

Sentiram necessidade de tornar esta próxima edição ainda mais especial?
Sim, porque nós gostamos sempre de arranjar pretextos para fazer edições especiais. O ano passado, devido ao confinamento, fizemos cinco dias, com o primeiro dedicado à música portuguesa. Este ano, o objetivo passa por manter a linha de Paredes de Coura e apresentar novos projectos, que é uma coisa que nos dá muito gozo. Existem bandas desconhecidas que se agigantam neste espaço e o nosso entusiasmo continua igual, sempre com o foco de programar um festival de qualidade. Nesta edição especial vamos tentar ter algumas bandas que fizeram parte da história do Paredes de Coura. Infelizmente, isto da contratação não é uma ciência exata, porque nem todas as bandas estão em digressão e depois há outras que não vêm para a Europa ou que acabaram. O ideal seria trazer sete, oito, dez bandas que fizeram parte da história de Paredes de Coura. Não sei quantas vamos conseguir, estamos ainda em fase de negociação, mas o objectivo é recordar um pouco dessa história.

Sente que será melhor que o ano passado ou do que a edição de 2005, por exemplo, onde estiveram nomes consagrados, como Kaiser Chiefs, Foo Fighters, Pixies, Arcade Fire, Queens of the Stone Age, The National, Nick Cave, entre outros?
O cartaz de 2005 foi considerado um dos melhores da Europa. Na altura acho que gastamos 1 milhão de euros em contratações. Hoje, para ter esse cartaz eram precisos 20 milhões (risos).

Mas Paredes de Coura tem também o dom de transformar nomes desconhecidos em grandes referências do panorama musical?
Mas Paredes de Coura sempre teve esse condão. Por isso é que eu digo às pessoas que vão ao festival para não se distraírem, porque podem perder um pedaço de história. Há pessoas que não viram os Parcels às 19h30 porque não conheciam, assim como outros. Muita gente vai ver os cabeças-de-cartaz e esquece-se de outros nomes que têm enorme qualidade. Em contrapartida, há também público que aguarda com antecedência e religiosamente pelo espectáculo em frente ao palco porque não quer perder um pedaço de história. Estas pessoas sabem que Paredes de Coura é sinónimo de qualidade!

«Gosto de adivinhar o sorriso na cara das pessoas, esse contentamento, essa magia que a banda provoca a quem não a conhece»

Há algum concerto imperdível que nos possa revelar e que promete marcar esta edição?
Muitos. Continuo a sonhar como se tivesse 18 anos… no outro dia, estava a ouvir Hermanos Gutiérrez e imaginava-os em palco. É um nome praticamente fechado para este ano! Fui ver uma série de vídeos e são enormes. Depois lembrei-me dos Khruangbin, que já estiveram no Paredes de Coura e, em 2022, no Primavera Sound e que se agigantaram a atuar para mais de 20 mil pessoas. Tenho a certeza absoluta que os Hermanos Gutiérrez vão ter o mesmo impacto. Gosto de adivinhar esse sorriso na cara das pessoas, esse contentamento, essa magia que a banda provoca a quem não a conhece. Há muitas bandas que aguardo com grande expectativa… posso também revelar a presença dos Explosions in the Sky. É um regresso e vai também marcar esta edição.

As bandas portuguesas continuarão em força?
Sim, Paredes de Coura sempre deu muita atenção à música portuguesa. Aliás, começou, em 1993, como um festival de música moderna portuguesa. E todos os anos, tentamos trazer o máximo possível de bandas nacionais. Mas também queremos muito mostrar o que se faz lá fora. As bandas portuguesas as pessoas vão vendo internamente, porque, felizmente, há cada vez mais facilidade e salas disponíveis. Mas apostar nas bandas nacionais continua a ser uma marca do Coura e nesta edição não será exceção.

Estão previstas novidades em termos logísticos ou melhorias nas infra-estruturas do festival?
Todos os anos mexemos no recinto. Nós tentamos sempre melhorar até aquilo que está bem feito. Apesar dos inquéritos anuais sobre as condições do festival nos dizerem que a média de satisfação do público é de 9, numa escala de 0 a 10. E ajustamos em vários segmentos, desde ter mais ligação das casas de banho à rede de esgoto, a criação de mais zonas de alimentação, a concepção de novos acessos e de novas zonas de descanso, nova decoração, entre outras medidas. E este ano, não será diferente. Já andamos entusiasmados a olhar para o terreno e todos estes pormenores são importantes no sentido de proporcionar boas condições a quem nos visita.

E os preços dos bilhetes vão-se manter?
Neste momento, situa-se nos 120 euros. Tudo dependerá também do cartaz. Estamos a negociar muitos artistas, estão cada vez mais inflacionados, os materiais das infra-estruturas também ficaram mais caros, mas não fugirá muito do que é praticado habitualmente. Aliás, Portugal continua a ter os bilhetes mais baratos do mundo. Em Inglaterra, por exemplo, um festival da dimensão do Vodafone Paredes de Coura, o bilhete custa, no mínimo, 250/300 euros. Portanto, continuamos a praticar preços muito acessíveis. Estamos a competir com economias muito mais fortes, como a inglesa e a qualidade que apresentamos é, muitas vezes, superior. Por isso é que temos cada vez mais estrangeiros. Os festivais são bem organizados, são mais baratos, come-se bem e há muita diversidade. Recebemos gente de todo o mundo, desde Inglaterra, Espanha, França, Irão, Israel, México É impressionante o alcance que o festival já conseguiu alcançar ao longo destes 30 anos, tornando-se uma referência em termos internacionais.

«O Paredes de Coura é o festival que mais tem contribuído para a forma de ouvir música em Portugal e o que mais nomes apresentou em primeira mão»

Quando é que percebeu que este festival se tornaria uma referência em termos nacionais e internacionais?
Tive essa perceção em diversas ocasiões. Numa primeira fase quando alteramos o conceito de um festival marcadamente nacional para a primeira internacionalização, com a primeira contratação de uma banda estrangeira, se não me falha a memória, os Shed Seven… e aí pensamos “Ok, isto pode crescer”. Depois, quando trouxemos Rollins Band, uma banda já com algum protagonismo e que crescemos a ouvir na MTV. Depois, dá-se a afirmação do festival em 1998, com Tindersticks ou Divine Comedy e, em 1999, uma edição fabulosa com Lamb, Guano Apes, Deus, Suede, entre outros. Nesse ano, sentimos que não haveria volta a dar, porque começaram a chegar dezenas de autocarros de todo o lado. Lembro-me de chorar de emoção e foi também nessa edição que aprendemos a ser empresários, porque até 1999, o festival nunca tinha dado lucro, só dava prejuízo. Era a Câmara e os nossos pais que nos ajudavam a suportar as despesas (risos). Foram momentos importantes que contribuíram para o crescimento do Festival Paredes de Coura. E como disse no início da entrevista, é o festival que mais tem contribuído para a forma de ouvir música em Portugal e o que mais nomes apresentou em primeira mão.

Mas houve também fases complicadas…
Sim, em 1999 houve um enorme sucesso comercial, ajudamos várias instituições, inclusive compramos um terreno e depois oferecemo-lo à Câmara, mas no ano seguinte, o festival deu prejuízo e, de repente, tínhamos toda a gente de mão estendida. Nós dizíamos que o festival tinha dado prejuízo e ninguém acreditava. A partir dessa altura começamos a ter mais cuidado com os orçamentos, mas financeiramente, as coisas não estavam a correr bem. Em 2004, por exemplo, trouxemos os Motorhead, uma banda na altura pouco conhecida mas que tinha e continua a ter um culto enorme. No entanto, apesar de ter sido um ano com uma programação fantástica, choveu torrencialmente e tivemos algumas complicações financeiras. Houve muitas complicações, o palco secundário desabou e toda a gente queria acabar com o festival, porque as entidades consideravam não existir condições mínimas de segurança. Nós não deixamos e refutamos que as poucas pessoas que pagaram bilhete mereciam que o festival se fizesse. Apesar do prejuízo brutal, acabar nunca foi hipótese e decidimos, com coragem, que o festival se realizasse em 2005. Em boa hora o fizemos, porque essa edição é, hoje em dia, considerada a melhor de sempre. Foi um sucesso estrondoso, onde brilharam Foo Fighters, Pixies, Nick Cave, Queens of The Stone Age, The Arcade Fire, entre outros.

«Temos um público realmente especial, dedicado, fiel, sensível e solidário. Eu conheço milhares de histórias de pessoas que se conheceram no festival e que iniciaram ali relações que ainda hoje perduram»

E qual foi o momento que mais o surpreendeu pela positiva?
O que mais me surpreende é termos um público tão dedicado e fiel. Não quero parecer pretensioso, mas a forma de nós estarmos, de programarmos e de montarmos o festival também ajudou a educar as pessoas. Mas, hoje, olho para trás e fico orgulhoso de nunca ter visto uma cena de pancadaria ou um incidente em Paredes de Coura. Temos um público realmente especial, sensível e solidário. Eu conheço milhares de histórias de pessoas que se conheceram no festival e que iniciaram ali relações que ainda hoje perduram.

É um evento especial também por acolher simultaneamente diferentes gerações…
Sem dúvida! Acolhe pessoas dos 7 aos 70 anos. É um festival que cuida das pessoas, que tem condições e onde as pessoas se sentem bem. Um espaço com relva, praia fluvial ou cozinhas comunitárias, onde conseguimos passar bons momentos em convívio.

Qual é o segredo para transformar um festival fora dos grandes centros num verdadeiro caso de sucesso?
É um case study, sem dúvida. Mas, apesar de ser neste local, a sua programação poderia muito bem brilhar em qualquer parte do mundo. É um festival de tendências que poderia ser em Nova Iorque, Tóquio ou Londres. E ser feito em Paredes de Coura, um concelho com cerca de 9000 pessoas, no meio da montanha, num concelho do interior, num país tão conservador e centralista, deixa-me com um brilho nos olhos. Antes, havia um desconhecimento total daquilo que o Norte era e representava, mas hoje em dia, já não é tanto assim e as pessoas já olham para a região com outros olhos. E o Festival Paredes de Coura contribuiu positivamente para esta mudança de paradigma e, atualmente, é o festival de música mais respeitado em todo o país em termos de imprensa, classe musical e pelas pessoas com sentido crítico. Com esta notoriedade, respeito e prestigio que o Paredes de Coura alcançou permitiu também que Portugal ganhasse fama internacional. E as bandas vêm propositadamente tocar a Paredes de Coura e gostam de atuar neste recinto.

Em termos de apoios para os festivais de música, o que é que tem mudado no nosso país?
Estamos muito contentes com o nosso patrocinador oficial. A Vodafone fala a nossa linguagem, percebeu que o Paredes de Coura é um festival diferente, quer em termos de comunicação, assim como de programação. Uma palavra também para a Câmara de Paredes de Coura, que tem sido incansável. Faltam apoios de um Governo que ainda acha que música é sinónimo de pagode e não de cultura. Por exemplo, durante o Primavera Sound, a taxa de ocupação dos hotéis é de 100%. O Rui Moreira adora o festival, apoia o festival e diz que é um evento absolutamente fundamental para a cidade. Tem a ver com a mentalidade de cada político. O presidente da autarquia de Paredes de Coura, Vítor Paulo Pereira, também apoia e tem esta mentalidade. Contribuímos para a riqueza das cidades, dos restaurantes e dos hotéis. Vêm para cá milhares de pessoas, há uma dinamização económica enorme e os apoios do Governo continuam na gaveta. Durante o confinamento, estivemos dois anos parados, sem qualquer tipo de apoio governamental. Aliás, há até um caso patético e absolutamente anedótico respeitante a um programa que tinha como objetivo apoiar a cultura e que dava a cada empresa 80 mil euros e ainda não recebemos o dinheiro. Como nós, há outras empresas que precisavam dessa verba para sobreviver e ainda não receberam o subsídio. Temos um governo muito estranho, que secundariza a cultura. Temos agora um novo ministro da Cultura que por acaso conheço e sei que tem bom gosto e gosta de música. Pode ser que as coisas mudem…

O Paredes de Coura é, assumidamente, um festival que aposta em música alternativa e em bandas emergentes, mas que, de um momento para o outro se tornam conhecidas e ilustres. Como é que fazem essa selecção com tanta mestria?
Primeiro foi a necessidade que aguçou o engenho. Numa primeira fase, não tínhamos dinheiro para as grandes bandas e, portanto, tentamos adivinhar o que é que viria a ser grande. Fomos ouvindo várias coisas. Eu oiço música desde os meus seis anos e a minha vida é essa. Todos os dias oiço música durante 5/6 horas. Adoro descobrir novos artistas, adoro dançar e faço-o com muito prazer. Hoje em dia, o festival tem de ter três ou quatro nomes grandes e depois dez nomes médios, mas eu gosto de apresentar aqueles que ninguém conhece e as pessoas saem de lá entretidas. Recordo, por exemplo, em 2002 o concerto de L’Impératrice, uma banda mediana francesa com cachê baixo, que poucos conheciam e que foi o concerto mais participado. Foi uma apoteose geral e agora são cabeças de cartaz noutro festival. Isso dá-me um gosto especial e só é possível em Paredes de Coura, exatamente porque temos um público especial.

O que é para si, um bom concerto?
Um bom concerto passa, essencialmente, por ouvir boa música. Mas quem não gosta da interatividade de um artista com o público? Eu gosto, mas também respeito quem não o faça. Eu vi há um mês, no Theatro Circo, os Tindersticks e fiquei absolutamente maravilhado! Já os vi várias vezes e estão cada vez melhores. Este último álbum está muito bom e o penúltimo, melhor ainda. Adorei o concerto do princípio ao fim. Sabes aqueles concertos em que te dá, repentinamente, vontade de ir ao WC e não vais porque não podes perder um segundo e tens de assistir ao concerto até ao fim? Aconteceu comigo e, no entanto, o vocalista não interage, não fala com o público. Cada caso é um caso e eu respeito muito o artista. Se o artista não quer falar, não fala, não tem de falar. Não é por isso que ele é bom. Se não quer fazer um jogo de anca, não faz um jogo de anca. Cada um rebola no que quer. Contudo, foram absolutamente maravilhosos, assim como os Pixies e tantos outros. Cada banda tem a sua forma de estar e conquistar. O essencial, para mim, passa sempre por tocarem boa música.

«Toda a gente em Paredes de Coura adora o festival. Dos 5 aos 80 anos. É bonito ver pessoas idosas nas varandas, com um ar sorridente e dizerem-nos que é a melhor semana do ano»

Além da visibilidade que traz à região, um festival desta dimensão tem também um grande impacto no desenvolvimento económico local e a vila de Paredes de Coura nunca mais foi a mesma desde o início do festival. Como é que os habitantes reagem?
Com unanimidade total e absoluta. Ninguém é contra, tenham cinco ou 80 anos. Toda a gente adora o festival. É bonito ver pessoas idosas nas varandas, com um ar sorridente, falar com elas e dizerem-nos que é a melhor semana do ano.

Sei que têm, enquanto organização, uma relação muito pessoal com o público. É também esta proximidade que faz deste festival um evento diferente?
Sim, é o nosso contributo para a vila e queremos também criar essa cumplicidade. Paredes de Coura é mais do que um festival. É um evento de cumplicidade e solidariedade, onde as pessoas se entreajudam, se conhecem e se divertem. Eu sou courense e gosto deste amor todo que as pessoas sentem por Paredes de Coura. Foi absolutamente enternecedor ver que durante o confinamento, não havendo festival, muita gente foi para lá. As pessoas alugaram casa, foram para o recinto, estavam sentadas, a banhos ou a conversar. Recebi centenas de mensagens de pessoas a dizer que iam à mesma para Paredes de Coura. Foi fantástico e com isso também ajudaram o comércio local. É muito bonito e comovente assistir a essas demonstrações de amor.

E o público pede-lhes bandas?
Isso acontece todos os dias (risos). Fazem muitas questões e perguntam por projectos pequenos, que são aqueles que até vou ouvir primeiro. Às vezes, sou surpreendido por coisas absolutamente geniais. Pessoas que estão no Canadá, que são da Noruega, que foram de férias e viram determinada banda num clube. Já vieram algumas bandas que foram sugeridas pelo público.

Existe alguma banda que ainda não conseguiram trazer a Paredes de Coura, mas que gostavam que fosse possível?
Sim, algumas. Adoro os Lambchop e não é uma banda tão cara quanto isso. Mas nunca os apanhei em digressão. Adoraria tê-los cá, mas não saem muito dos EUA. Gostava de trazer também The Smile, uma banda composta pelos membros do Radiohead, ou voltar a trazer Nick Cave…

Nick Cave é, aliás, um dos artistas que não esquece Paredes de Coura e que continua a fazer juras de amor ao festival…
Sim, sim, é verdade. E muitos outros…

«O Festival Paredes de Coura é amor e paixão. É especial, porque nasceu na nossa terra. Foi lá que mudamos toda a nossa vida. É o festival com mais identidade em Portugal»

O que significa para si, o Festival Paredes de Coura?
Amor e paixão. É especial, porque nasceu na nossa terra. Foi lá que mudamos toda a nossa vida. Se não fosse o Festival Paredes de Coura, hoje, teríamos vidas mais chatas de certeza absoluta. Seríamos economistas, radialistas ou sociólogos (risos). Gosto muito deste projecto, tenho noção que tem de ser “alimentado” todos os anos, é um festival difícil, porque está longe dos grandes centros, não há hotéis e as pessoas têm que acampar. Ao longo de 30 anos, é rara a noite que eu não penso no festival.

Defende que os festivais devem ter identidade. Isso significa exatamente o quê?
Ter identidade é não te prostituíres. O Coura é um festival de tendências onde pode ter um artista de hip hop, como pode caber um artista de eletrónica, desde que tenha qualidade. Portanto, é um festival que tem uma identidade própria, um festival onde não tocariam, por exemplo, os Maroon 5. Mesmo que eu tivesse a certeza absoluta que a banda esgotava essa noite. O Paredes de Coura também já foi um festival muito mais rock. Hoje em dia o mundo mudou. Decresceu imenso a venda de guitarras, há cada vez menos bandas com guitarras, há cada vez mais música electrónica e com outras sonoridades. E há muitas coisas a acontecer no mundo da música absolutamente fenomenais. Vamo-nos, obviamente, adaptando ao momento, mas há uma regra de ouro: tem de ter qualidade. E as pessoas sabem que vão encontrar uma programação cuidada, que abrange vários géneros musicais. O Paredes de Coura é o festival com mais identidade em Portugal. Disso, não tenho qualquer dúvida.

E há lugar para tantos festivais de verão em Portugal, como tem acontecido nos últimos anos?
Se me fizessem essa pergunta há três anos diria que quantos mais festivais melhor, porque são uma forma de criar hábitos de consumo de música ao vivo e é bom para o mercado. Mas, neste momento, considero que está um pouco saturado. Começo a pensar que são muitos festivais. O país é pequeno, a economia é fraca e temos que vender os bilhetes baratos. E nos últimos anos apareceram mais cinco/seis festivais de média dimensão em Portugal, para não falar nos festivais pequenos onde surgiram mais de 50. Só para citar grandes festivais, temos Paredes de Coura, Primavera Sound, NOS Alive, Super Bock Super Rock, Marés Vivas, Sudoeste, Rock in Rio, Kalorama ou Neopop. São muitos festivais para a nossa dimensão.

Vai a quais?
Vou ao Paredes de Coura e ao Primavera Sound (risos). Depende… o ano passado fui ao NOS Alive ver Fontaines D.C. que é uma das minhas bandas preferidas. Já fui ao Neopop ver Underworld… normalmente, vou ver bandas. Não vou aos festivais.

O que é que tem ouvido, em termos musicais, nos últimos tempos?
Há pouco estava a ouvir Confidence Man, que em princípio, virá a Paredes de Coura. Antes disso, estava a ouvir Fever Ray, que tem um último disco muito bom e é também um dos nomes confirmados na edição deste ano. Voltei a ouvir Cousteau, uma banda que eu adoro, que já esteve em Paredes de Coura e que já não ouvia falar há algum tempo. Tenho ouvido também Kevin Morby, que estará de passagem por Portugal, com concertos agendados para julho em Lisboa. Para além disso, tenho ouvido Tim Bernardes, The Postal Service, Fred Again e Water From Your Eyes.

Water From Your Eys estará precisamente no Courage que se realiza em Fevereiro em Guimarães…
Sim, é verdade. Vão fazer a primeira parte do concerto dos Interpol. O Courage é mais uma marca de Paredes de Coura que surgiu na pandemia e que correu muito bem. Este ano será em Guimarães e já está esgotado.

Para terminar, há alguma mensagem que queira deixar a todas as pessoas que aguardam pacientemente pelo Festival Paredes de Coura deste ano?
É verdade, as pessoas estão ansiosas (risos). Vamos anunciar novos nomes brevemente e, até finais de fevereiro, temos o cartaz completamente fechado. Há alguns pormenores para alinhavar, principalmente com algumas grandes bandas. As pessoas são muito amáveis, mandam todos os dias mensagens a dizer que estão com saudades, partilham fotos e vídeos de momentos que viveram no festival e só tenho a agradecer-lhes por toda esta onda de carinho, ternura e amor que têm dedicado sempre ao Paredes de Coura. Temos realmente um público diferente, que tem sensibilidade e que gosta de boa música. Muitas destas pessoas, eu conheço-as há muitos anos, tenho o gosto de vê-las crescer, a constituir família e continuam a partilhar as suas memórias deste festival. É fantástico! Só lhes peço que tenham um pouco mais de paciência (sorriso).

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