Este mês venho propor a leitura de um romance que atravessa o mundo na segunda metade do século XX. É da autoria do Nobel da Literatura Mario Vargas Llosa que nos encanta, sem remorsos, com descrições sobre as maiores cidades do mundo e passagens sobre a natureza do homem e, sobretudo, do amor. Ricardo Somocurcio é um menino peruano com o sonho de viver em Paris quando conhece Lily, uma chilena, que lhe rouba o coração. Lily não o ama de volta, não se chama Lily nem sequer é chilena. Ainda assim, o amor persiste no coração de Ricardo que vem a encontrar a sua chileninha ou menina má, como ele a apelida, muitos anos depois em Paris. Os dois envolvem-se e Ricardito, perdido de amores, planeia uma vida a dois. O problema é que a menina má é ambiciosa e teima em não aceitar a simplicidade e a mediocridade da vida que o seu pobre apaixonado lhe quer dar. Por conseguinte, a menina aparece e desaparece da vida de Ricardo conforme as suas vontades e necessidades. De todas as vezes, Ricardo ama-a com a mesma intensidade com que ela lhe parte o coração.
Dizem as línguas viperinas que Travessuras da Menina Má é uma ficção levemente autobiográfica do autor. Confesso que não imaginava Vargas Llosa no papel do nosso narrador porque Ricardo é a personagem mais ingénua que eu já tive o prazer de ler. Como ele próprio nos diz, era tão boa pessoa que toda a gente o chamava de Ricardito. E, talvez, por isso se tornou presa fácil da menina má que, por contraposição, é interesseira e egoísta. O fascínio de Ricardo pela menina má é difícil de perceber, mas, de alguma forma, o leitor não consegue deixar de torcer para que aquela relação dê certo. De todas as vezes que a menina má aparece na vida de Ricardo, o leitor sabe que, uma manhã qualquer, ela vai desaparecer, mas isso não o impede de desejar, com todas as forças, que tal não aconteça.
Esta dinâmica prendê-lo-á ao longo dos vários capítulos e, a certa altura, a repulsa pelo comportamento da menina má será tanta que continuará a ler na expectativa de ver Ricardo tomar, definitivamente, uma posição. Tudo isto se passa na segunda metade do século XX em vários pontos do mundo – desde a Paris boémia dos anos 50 a Madrid dos anos 2000, passando pela explosão de cultura de Londres dos anos 70 e pelo Japão dos anos 90. Vargas Llosa escreve com mestria e apresenta-nos o mundo pelos seus olhos utilizando Ricardo e a sua menina má numa das histórias mais apaixonantes que ele, alguma vez, escreveu.
Deixo-o com uma citação de Travessuras da Menina Má, para se deliciar e ficar com vontade de correr já para a livraria. “Na segunda metade dos anos 60, Londres destronou Paris como cidade das modas que, partindo da Europa, se espalhavam pelo mundo. A música substituiu os livros e as ideias como centro de atração dos jovens, sobretudo a partir dos Beatles, mas também de Cliff Richard, dos Shadows, dos Rolling Stones com Mick Jagger e outros grupos e cantores ingleses e dos hippies e da revolução psicadélica dos flower children.” Boa Leitura!
Daniela Guimarães
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